quinta-feira, junho 15, 2006

Recifes de Corais: ilustres desconhecidos

Por Jaqueline B. Ramos*

O desenho animado “Procurando Nemo”, visto por milhares de pessoas em todo o mundo, deu uma grande contribuição para a ecologia e para a educação ambiental. A história da aventura do peixinho com uma barbatana defeituosa no mar australiano retrata muito bem o ambiente marinho e, sobretudo, o ecossistema chamado ‘recife de coral’. Embora muitos tenham se dado conta da importância dos corais para a conservação dos oceanos ao assistir o filme, infelizmente o público em geral ainda conhece pouco sobre a importância deste singular ecossistema.

Os recifes de corais são ecossistemas marinhos muito ricos em biodiversidade.
Eles estão para o ambiente marinho como as florestas tropicais estão para os ambientes terrestres. Ou seja, os dois são os maiores centros de biodiversidade do planeta. Entre as inúmeras espécies que vivem nos corais estão os cnidários, as algas, as esponjas (poríferos), os vermes poliquetos (anelídeos), os moluscos, os crustáceos, os equinodermos e diversos tipos de peixes. Para se ter uma idéia, de cada quatro espécies marinhas, uma vive em ambientes recifais (incluindo 65% dos peixes).

Geologicamente, os corais existem há, aproximadamente, 200 milhões de anos e alcançaram seu nível atual de diversidade biológica há 50 milhões de anos. A formação desses ecossistemas aconteceu da seguinte forma: primeiramente animais sem esqueletos e flutuantes associaram-se à algas microscópicas e fixaram-se às rochas, formando colônias. Estas colônias são os corais, que ao se concentrarem formam o habitat marinho recife de corais.

Por sua rica biodiversidade, os recifes de corais têm características muito importantes para o equilíbrio ecológico do ambiente marinho. Além de exportar matéria orgânica e nitrogênio para suas zonas circundantes, aumentando a produtividade dessas águas, eles consistem em um importante local de reprodução e de crescimento juvenil para muitas espécies de peixes. Mas, infelizmente, na mesma intensidade em que a história evolutiva formou um ecossistema muito rico em vida, os recifes são sistemas extremamente frágeis e susceptíveis à perturbação natural e humana.

Degradação

De acordo com o Global Coral Reef Monitorinng Network – GCRMN , uma rede de governos, organizações não-governamentais (ONGs), institutos e indivíduos que monitoram a saúde destes ecossistemas, cerca de 27% dos recifes de coral do mundo estão definitivamente perdidos. Se as atividades predatórias continuarem no mesmo ritmo, sem nenhuma ação remediadora, o GCRMN calcula que a parcela de recifes perdidos atingirá o alarmante índice de 40% até 2010.

A degradação dos recifes de corais está intimamente ligada às atividades humanas e econômicas. O aquecimento dos oceanos, por exemplo, resultado de mudanças climáticas, causam o grave impacto de expulsão de algas, as zooxantelas, que habitam os recifais. Este efeito se chama branqueamento. Outras causas de degradação são a poluição das águas, a mineração de areia e rocha, o uso de explosivos e cianeto (ou outras substâncias tóxicas) em atividades pesqueiras e a própria pesca predatória e sem controle em suas áreas.

Para agravar a situação, o impacto ambiental negativo nos recifes de corais vem acompanhado de uma crise social, principalmente em relação às populações costeiras. Quase meio bilhão de pessoas vive num raio de 100 quilômetros de um recife de coral e muitos dependem deles para alimentação e geração de renda. Cerca de um quarto do pescado dos países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, é proveniente de áreas de coral. Na Ásia, este pescado é a base da alimentação de um bilhão de pessoas. No Brasil, estima-se que cerca de18 milhões de pessoas dependem direta ou indiretamente desses ambientes.

Vale também ressaltar que os recifes de corais também protegem as praias da erosão e ajudam a produzir as areias finas que as tornam atraentes para o turismo, uma importante fonte de receita de muitos países tropicais. Em geral, os bens e serviços gerados pelos recifes foram avaliados, com dados de 1997, em US$375 bilhões anuais.

Ocorrência no Brasil e no mundo

Embora se encontrem corais em todos os oceanos, somente nas águas tropicais se desenvolvem os recifes. Eles são comuns na costa leste da África, no oceano Índico, no Atlântico e no Pacífico, especialmente na costa das Filipinas, Papua Nova Guiné, Polinésia, nordeste da Austrália e nas ilhas do leste australiano até o Havaí, zonas onde a temperatura média anual da água é superior a 20ºC no inverno. Os recifes estão ausentes ou são reduzidos nos limites das áreas tropicais, como na costa oeste da América do Sul e da África, devido às zonas de upwelling (interface entre o meio marinho e terrestre onde ocorre elevação de massas de água fria de áreas mais profundas) e à existência de correntes frias.

No Brasil, os recifes de coral se distribuem por aproximadamente 3 mil quilômetros da costa, do estado do Maranhão ao Sul da Bahia, mais especificamente Abrolhos, representando as únicas formações recifais do Atlântico Sul. Nessa área existem nove unidades de conservação, que protegem uma parcela significativa do ecossistema recife de coral.

Considerando a importância desses ambientes marinhos e, infelizmente, as altas taxas de degradação assistidas, o Governo Brasileiro, através da Diretoria de Áreas Protegidas (DAP – Ministério do Meio Ambiente) começou, em 1999, a implementar iniciativas com o intuito de formar uma Rede de Proteção nos Recifes de Coral. A primeira foi desenvolver um projeto, juntamente com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, de mapeamento dos recifes existentes dentro das diversas unidades de conservação brasileiras. Este projeto teve como principal produto o “Atlas dos Recifes de Coral nas Unidades de Conservação Brasileiras”, uma publicação que foi pioneira ao disponibilizar mapas do ambiente recifal brasileiro, num total de 39 cartas.

A segunda iniciativa foi a concepção da Campanha de Conduta Consciente em Ambientes Recifais, cujo objetivo é divulgar regras de conduta a serem adotadas nas modalidades de turismo que envolvem os recifes de coral. A terceira iniciativa diz respeito ao estabelecimento do Projeto Piloto de Monitoramento de Recifes de Coral do Brasil, iniciado em 2002 e coordenado pela Universidade Federal de Pernambuco, com apoio financeiro do Ministério do Meio Ambiente

Assim como o peixinho Nemo no desenho, os recifes de corais são muito ricos em vida, mas também apresentam sua parcela de fragilidade. Só depende do homem, ao obter informações e colocar em prática atitudes sustentáveis, evitar que essa fragilidade se transforme em uma ameaça para o equilíbrio do ecossistema e de todo ambiente marinho.

Tipos de Recifes

Os recifes aparecem em diferentes tamanhos e formas, dependendo das condições hidrológicas e geológicas. Os tipos de recifes mais comuns são atol, recife barreira e recife de franja.

Os atóis têm a forma de um anel emergindo da água profunda, longe de terra firme, com uma lagoa no seu interior. Existem 425 atóis documentados no mundo e o maior deles é o de Kwajalein, nas ilhas Marshall, na Oceania.Os recifes barreira e de franja são muito parecidos. Ambos são adjacentes a massas de terra. A maior barreira de coral do mundo tem aproximadamente 2 mil quilômetros e situa-se ao longo da costa nordeste da Austrália.

Fontes: Ministério do Meio Ambiente, Conservation International e Naturalink

Leia mais: Global Coral Reef Monitorinng Network - http://www.gcrmn.org/

*Matéria publicada no Informativo do Instituto Ecológico Aqualung março/abril 2006