quinta-feira, dezembro 20, 2007

Revista dos Vegetarianos n. 12 (outubro 2007) - edição on line: http://www.europanet.com.br/euro2003/index.php?cat_id=950&pag_id=15850

Animal Rights 2007

Por Jaqueline B. Ramos*

A relação do veganismo com o controle do aquecimento global, estratégias para derrubar o AETA (Animal Enterprise Terrorism Act), emenda aprovada pelo Congresso dos EUA em 2006 que considera ativistas como terroristas, e o apoio ao movimento de Direitos Animais declarado pelo candidato a presidência dos EUA/2008 Dennis Kucinich, que (pasmem!) é vegano. Estes foram alguns temas de destaque da Animal Rights 2007, conferência nacional que é ponto de encontro todos os anos de ativistas de direitos animais dos Estados Unidos. No evento se discute e trocam-se idéias sobre os avanços e as principais questões que permeiam o movimento no país e algumas experiências estrangeiras.

A Animal Rights foi idealizada pela organização sem fins lucrativos FARM (Farm Animal Reform Movement) e é realizada há 15 anos (entre 1981 e 1987, em 1997 e todos os anos desde 2000). A conferência de 2007 aconteceu de 19 a 23 de julho no hotel Westin LAX, em Los Angeles (a cada ano o evento é realizado numa costa americana, se revezando entre as cidades de Los Angeles e Washington) e contou com aproximadamente 1000 participantes de todo os Estados Unidos. E este ano se bateu o recorde em número de outros países sendo representados: foram 10, entre eles o Brasil (o nutricionista George Guimarães, da nutriVeg e do VEDDAS, fez uma apresentação sobre a legislação brasileira de direitos animais em um dos painéis da conferência), a China, o México, a Índia, a Etiópia e a Austrália.



Nos cinco dias de conferência o clima foi de integração e, principalmente, acesso a muita informação sobre as últimas conquistas e desafios em prol dos animais em todas as áreas de atuação (produção, laboratórios, entretenimento, ações diretas etc) e sobre veganismo, considerado, por unanimidade, a forma mais prática de respeito aos direitos animais. Foram mais de 100 palestrantes de 70 entidades diferentes falando em 120 sessões e plenárias ao final de cada dia. Entre eles ativistas-celebridades, como Paul Watson, fundador da Sea Shepherd Conservation Society, mundialmente conhecido por suas ações diretas e arriscadas contra a caça de baleias na Antártica, e Howard Lyman, um ex-fazendeiro que se tornou vegano, falou abertamente sobre suas idéias no popularíssimo programa da Oprah Winfrey e se dedica a divulgar o veganismo como uma questão de sobrevivência do planeta.

Além das sessões e plenárias, os participantes tiveram a chance de visitar uma feira que contou com cerca de 90 expositores de roupas, acessórios, comida vegana e literatura e assistir a 50 vídeos-documentários sobre abuso contra animais e ações de defesa. A organização da conferência também preparou uma noite especial com o serviço de um jantar vegano oferecido pelo hotel, um leilão beneficente e entrega de prêmios para ativistas e personalidades que adeptos ao movimento, como o músico John Feldmann, guitarrista e líder da banda Goldfinger, que divulga o veganismo através de sua música e apóia abertamente movimentos como o SHAC (Stop Huntingdon Animal Cruelty) e a ALF (Animal Liberation Front, Frente de Libertação Animal, em português), este último conhecido por suas ações diretas em laboratórios.

Mas um dos pontos altos da conferência foi a crítica coletiva ao Animal Enterprise Terrorism Act, tema de várias palestras e de uma série de workshops. “Um dos destaques este ano foi o reforço da importância da defesa da liberdade de expressão particular e dos grupos ativistas, que fica ameaçada com o AETA”, diz Alex Hershaft, presidente da FARM e idealizador da Animal Rights, se referindo ao avanço nas discussões sobre as estratégias do movimento para unir forças e conseguir anular a emenda que coloca qualquer pessoa ou organização de defesa de animais no mesmo nível de terroristas, punindo inclusive protestos pacíficos.

Direitos Animais e Meio Ambiente

Outro destaque da Animal Rights 2007 foi a declaração oficial de apoio aos direitos animais dada por Dennis Kucinich, candidato à presidência dos EUA em 2008 e um dos únicos congressistas americanos adeptos da dieta vegana. Através de uma áudio-conferência, Kucinich falou para um auditório lotado sobre as suas crenças e o seu comprometimento no cenário político a favor da sustentabilidade para a preservação de todas as espécies de vida e do meio ambiente. “Tratar mal os animais reflete na paz do mundo”, afirma o candidato, ressaltando que ser vegano não somente rendeu melhorias à sua saúde, mas também reforçou o fato de acreditar que todas as espécies de animais são sagradas.

O discurso de sustentabilidade e com tiradas de visão holística de Kucinich foi o gancho para um outro assunto extremamente importante tratado na conferência este ano: a relação da dieta vegana com o controle do aquecimento global. Em outras palavras, a relação dos direitos animais com o equilíbrio ambiental do planeta. Ou simplesmente pode ser lido como Ativismo e Ambientalismo, o que um tem a ver com o outro? A resposta concluída foi: tudo. “Eu acredito que muitos veganos fazem a opção pela dieta pensando nos animais apenas. No entanto, eles acabam ajudando na melhoria de sua saúde e da saúde do planeta. Infelizmente muitos líderes ambientalistas ainda não se deram conta da importância da dieta vegana”, ressalta Hershaft, tratando este papel de equilíbrio do veganismo como um outro ponto forte do evento.

Saurabh F. Dalal, presidente da União Internacional Vegetariana/ América do Norte, fez uma apresentação sobre a influência da atual dieta onívora adotada pela humanidade nas mudanças climáticas em uma das plenárias principais que ajudou a enriquecer ainda mais a discussão de Direitos Animais e Meio Ambiente. “Ser vegano é fundamental, mas precisamos rever ainda mais nossos hábitos de consumo. Temos realmente que nos tornar mais verdes”, alertou Dalal, que foi agraciado com uma placa de reconhecimento por seu trabalho de multiplicação de idéias de vegetarianismo e ativismo iniciado em Washington, DC e que hoje abrange os Estados Unidos e outros países.


Retratando em números, a própria Organização das Nações Unidas, através de relatório oficial de 2006, já demonstrou e divulgou o fato de que a criação industrial de animais é responsável por aproximadamente 18% das emissões de gases de efeito estufa. Em termos comparativos esse número é maior, por exemplo, que o das emissões geradas pelos meios de transporte. Ou seja, a grande quantidade de carros representa um problema, mas já está provado que a dieta onívora globalizada tem impacto negativo ainda maior no aquecimento global. A solução para mudarmos esta situação? Dalal sugeriu a divulgação das vantagens da dieta herbívora como uma das estratégias de mitigação dos desequilíbrios ambientais, ressaltando a importância do trabalho do ativista.

“Além de mudanças no atual modelo energético, pensando numa escala mais generalista, é necessário trabalhar na conscientização das pessoas sobre estes fatos relacionados à sua alimentação. O resultado será uma mudança de comportamento e hábitos em larga escala, ingrediente principal para uma mudança de modelo da dieta global”, explicou Dalal. Seja no cenário da relação do ativismo com o meio ambiente ou nas controversas áreas de produção e experimentação com animais, pode-se afirmar que uma das principais reflexões deixadas pela Animal Rights 2007 para seus participantes é a seguinte: cabe aos ativistas divulgar informações e fazer esclarecimentos para o público em geral. Como bem ressaltou Michael Budkie, diretor da organização SAEN – Stop Animal Exploitation Now (Pare a Exploração Animal Agora), “as pessoas simplesmente não sabem o que acontece nos bastidores. Nós devemos dar a elas as informações. Esta é a nossa missão.”

* Jaqueline B. Ramos foi convidada pela organização da Animal Rights 2007 para fazer a cobertura fotográfica do evento (http://www.arconference.org/photos7/)

Saiba mais:
FARM - http://www.farmusa.org/
Conferência Animal Rights - http://www.arconference.org/
Equal Justice Alliance (organização contra o AETA) – http://www.noaeta.org/
União Internacional Vegetariana/América do Norte – http://www.ivu.org/vuna

Entrevista exclusiva: Capitão Paul Watson, Sea Shepherd Conservation Society


“Sou um ambientalista”

O capitão Paul Watson é uma das figuras mais respeitadas e controversas tanto no meio ambientalista como no de direitos dos animais. Fundador da Sea Shepherd Conservation Society, Watson participou de suas primeiras ações de protestos no final da década de 60, inclusive das que deram origem ao Greenpeace. Numa operação em 1975 testemunhou de seu barco uma situação que mudaria sua vida para sempre: a morte de uma baleia caçada por soviéticos. Desde então se dedica à defesa destes e de todos os outros animais marinhos através de ações diretas contra baleeiros e caçadores. E chama esse trabalho de ambientalismo, e não de ativismo.

Da saída do Greenpeace – há quem diga que ele foi expulso por divergência de táticas – a discursos nos quais afirma sem titubear, por exemplo, que um ambientalista que não suporta o vegetarianismo é um hipócrita, Watson coleciona atitudes e afirmações apoiadas por muitos e criticadas por outros. “Recebemos o rótulo de piratas do mar e não tenho medo de dizer que tenho muito orgulho disso. Um pirata resolve por ele mesmo, sem receber ordens do Governo. Nossa missão é salvar o planeta. Nossos clientes são os animais”, dispara para a platéia da Animal Rights sob aplausos numa das plenárias.

Em 2007 a Sea Shepherd completa 30 anos e Paul Watson e sua tripulação se preparam para voltar ao mar em ações no Japão e nas Ilhas Galápagos, no Equador. Entre um intervalo e outro das sessões da conferência em Los Angeles, o capitão deu esta entrevista para a Revista dos Vegetarianos:

Na sua opinião, quais foram as principais mudanças do movimento de defesa dos direitos dos animais que ocorreram da década de 70 até hoje?

Na verdade o movimento mudou bastante. Nos anos 70, por exemplo, as pessoas não sabiam o que era um vegano. Atualmente já é um termo bem mais conhecido e aceitável, o que representa uma grande mudança. Além disso, também não é difícil achar bons restaurantes veganos em todas as grandes cidades do mundo. O movimentou avançou tremendamente rápido e cada vez mais pessoas estão ingressando na comunidade vegetariana. Eu acredito que por volta do ano 2020 o mundo será majoritariamente vegetariano. Aí as pessoas lembrarão da cultura do século XX como algo bárbaro e primitivo, de um tempo em que as pessoas comiam carne.

A conexão entre os movimentos ambientalistas e os de direitos dos animais seria um dos grandes desafios do momento?

O que acho mais importante é o movimento ambientalista reconhecer um fato que é a base de tudo: ninguém é ambientalista se não apoiar o vegetarianismo. Uma coisa está intimamente ligada à outra. A indústria da carne emite mais gases de efeito estufa que a indústria automobilística. Quando você come um bife está também levando para a mesa milhares de galões de água. E ainda assim o movimento ambientalista, de uma forma geral, se nega a assumir isso. Todo mundo se diz ambientalista até que se impacte sua zona de conforto ou se ameace seu estilo de vida. A Sea Shepherd é um grupo conservacionista que defende questões de direitos dos animais e algumas vezes acabamos sendo julgados como radicais. Mas na verdade é nisso que consiste o trabalho de conservação. Não me considero um ativista de direitos dos animais. Sou um ambientalista.

Nas reuniões da Comissão Baleeira Internacional e da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies Ameaçadas de Extinção, em maio e junho desse ano, a atuação da Sea Shepherd e de outras organizações garantiu a proteção das baleias com a sustentação da proibição da caça. Qual é a importância disso para o movimento?

Nossa principal vitória em prol das baleias foi em 1986 com a instituição da moratória global contra a caça. Mas infelizmente 18 mil baleias já foram mortas pelos japoneses desde então, o que demonstra que lidamos com uma atividade ilegal. A conquista esse ano foi termos conseguido manter a ilegalidade, o que ajuda muito, por exemplo, no controle do tráfico da Islândia e Noruega para o Japão. Mas as regras ainda precisam de mais força e é nesta linha que procuramos atuar. Não somos uma organização de protesto. A estratégia da Sea Shepherd é ir a campo para garantir a aplicação das leis internacionais de conservação e todas as suas regulamentações. Nossos protestos são até bem conservadores (risos).

Qual seria a melhor maneira de falar com consumidores em geral, pessoas que não são vegetarianas ou veganas, para passar a mensagem de que o ambientalismo começa pela boca?

A melhor maneira é assustá-los começando por esclarecer em que consiste a sua comida (risos). Há níveis aceitáveis de ingestão de algumas substâncias duvidosas contidas em alimentos industrializados e o consumidor não se dá conta do impacto disso. O mais importante é explicar o que as pessoas estão fazendo para a sua própria saúde. A maior parte dos problemas de saúde nos EUA e em outros países poderia ser resolvida simplesmente com uma mudança de dieta.

Você acompanha os trabalhos da Sea Shepherd no Brasil?

O Instituto Sea Shepherd Brasil é independente e administrado por brasileiros para tratar de questões locais. Eles tomam todas as decisões e estão muito envolvidos em ações de combate à pesca ilegal, um trabalho o qual incentivamos e encorajamos o desenvolvimento por parte de cada grupo localmente em seus países. Temos alguns integrantes brasileiros fazendo parte da tripulação de nosso navio principal e numa das vezes que fui ao Brasil tive a chance de participar de operações em Fernando de Noronha. Basicamente trocamos informações e apoiamos as ações uns dos outros.

Há regras de vegetarianismo para os integrantes da Sea Shepherd e de suas representações em outros países?

Não temos nenhuma regra específica de vegetarianismo para os integrantes. A Sea Shepherd internacional tem duas regras que obrigatoriamente devem ser seguidas: não se pode fazer nada que vá ferir pessoas e não fazemos acordos com os opositores. Porém, não abrimos mão da refeição nos navios. Eles são veganos e quem embarca nele acaba sendo vegano. Servimos ótimas refeições veganas e acreditamos que as pessoas têm a chance de experimentar e fazer suas próprias escolhas. Não acho que temos que forçar as pessoas a serem vegetarianas, mas sim dar bons exemplos para serem aplicados naturalmente por cada um.

2 comentários:

Anônimo disse...

Aprendi muito

Anônimo disse...

Rumboy,

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