Curtas ambientais
por Jaqueline B. Ramos*
Destaque: “Nossa saúde é inseparável da saúde do mundo natural”
Às vésperas da 9ª Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica, ocorrida no final de maio na Alemanha, a IUCN (International Union for Conservation of Nature) anunciou o lançamento de um livro com informações que demonstram, de forma clara e objetiva, a ligação direta da saúde humana com a biodiversidade do planeta. “Sustentando a vida: como a saúde humana depende da biodiversidade” (‘Sustaining Life: How Human Health Depends on Biodiversity’, editado por Oxford University Press) consiste em um detalhado estudo assinado por especialistas que mostra que uma nova geração de antibióticos e novos remédios para tratamentos de doenças como a osteoporose, falência dos rins e câncer estão ameaçados caso o mundo não faça algo para reverter os crescentes números de destruição de animais e plantas nos ambientes naturais.
Aaron Bernstein é pesquisador da Escola de Medicina da Universidade de Harvard e um dos autores do livro. Ele deu esta pequena entrevista, por e-mail, para o Informativo do Instituto Ecológico Aqualung:
O livro demonstra cientificamente que muitos estudos para avanços na medicina podem ficar comprometidos devido às altas taxas de extinção de espécies registradas. Você poderia destacar as principais ameaças?
Aaron: Apresentamos sete estudos de caso com ursos, caranguejo-ferradura, anfíbios, tubarões, primatas não-humanos, plantas giminospérmicas (com sementes desprotegidas) e moluscos e todos reforçam o fato das espécies ameaçadas serem muito importantes para a medicina. No caso do gênero dos moluscos, por exemplo, dentro dos quais podemos pensar em cerca de 700 espécies que vivem nos recifes de corais, é comprovado que eles produzem provavelmente o maior número e diversidade de substâncias terapêuticas usadas em tratamentos médicos.
Considerando que o Brasil é um dos países mais ricos do mundo em termos de biodiversidade, qual seria o papel do país neste contexto?
Aaron: Há muitas espécies brasileiras, principalmente de sapos, nas quais vários novos peptideos antimicrobianos (pequenas proteínas que têm capacidade de matar bactérias) já foram identificados, inclusive alguns que ajudaram no desenvolvimento de remédios e avanços no tratamento de hipertensão no decorrer do último século. Felizmente, nenhuma dessas espécies se encontra ameaçada, mas o rápido crescimento do número de espécies brasileiras entrando na Red List alerta para o risco de não termos chance de conhecer animais e plantas antes deles desaparecerem.
Você afirmaria que o principal objetivo do livro é alertar os Governos sobre a importância da preservação da biodiversidade para questões de saúde pública?
Aaron: Sim, esperamos que o livro seja uma inspiração para mudanças políticas, mas também queremos ajudar todos a perceber que a nossa saúde é inseparável da saúde do mundo natural.
Origem da carne brasileira
O ex-beatle Paul McCartney tem feito um apelo, nos últimos meses, para as pessoas repensarem sua dieta em prol do meio ambiente. Mesmo não se tornando vegetarianas, ele afirma que a diminuição do consumo de carne, escolhendo dias específicos para cortá-la do cardápio, já seria de grande valia para a saúde do planeta. O argumento do músico inglês é embasado em pesquisas e dados que mostram o significativo impacto ambiental causado pela pecuária industrial, passando pela degradação de florestas para formação de pasto e pela grande quantidade de água utilizada para a criação dos animais.
Além do cenário internacional, a discussão sobre pecuária e problemas ambientais também vem ganhando manchetes de jornais no Brasil, pois o assunto está diretamente ligado à devastação da Amazônia. Visando descobrir se a carne vendida não provém de área de desmatamento ou de trabalho escravo e alertar o consumidor sobre a importância de conhecer a origem do produto comprado, o IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor divulgou, no dia do meio ambiente (05/06), o resultado obtido depois de pedir informações detalhadas sobre a origem da carne vendida nas principais redes de supermercado do país. Infelizmente as informações passadas não foram muito convincentes ou esclarecedoras, segundo o instituto.
Em geral, as respostas das empresas afirmam que existe a preocupação sobre a origem da carne, sendo relatada a inclusão de cláusulas contratuais que garantem esse compromisso por parte dos fornecedores. As empresas também afirmaram realizar um controle da efetividade dessas cláusulas, para alguns aspectos, porém não especificaram como é feita essa verificação. Apenas o Carrefour e o grupo Pão de Açúcar detalharam alguns procedimentos de rastreabilidade, mas estes ficam restritos a programas de qualidade específicos que não englobam toda a carne comercializada.
Com o objetivo de incentivar a população a cobrar dos supermercados esse controle de rastreabilidade da carne, o IDEC disponibiliza nos sites www.idec.org.br e www.climaeconsumo.org.br um cartão postal eletrônico que pode ser redirecionado para as empresas. Além disso, o instituto aconselha o consumidor a buscar outros meios para fazer esse questionamento, como pessoalmente nos supermercados ou via Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC).
Alerta sobre aumento do nível do mar
Em abril um grupo de pesquisadores britânicos e finlandeses divulgou uma descoberta que tornam ainda mais sérias as previsões sobre os impactos do aquecimento global. Uma nova análise demonstra que o nível dos oceanos pode aumentar em 1,5 metro até o final deste século. Esta previsão funciona como um alerta se comparada aos números que foram divulgados oficialmente em 2007 pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês): o aumento previsto do nível do mar era de 28 a 43 centímetros até 2100.
Um metro e meio é três vezes mais do que o sugerido pelo IPCC e poderá representar um grande impacto em países mais baixos, como Bangladesh, que tem entre 80% e 90% do seu território dentro de um metro ou mais do nível do mar "Nos últimos 2 mil anos a média global foi muito estável, variou apenas cerca de 20 centímetros", afirmou Svetlana Jevrejeva, uma das cientistas autoras do estudo, à BBC. "Mas, no final do século, prevemos que o nível do mar deve subir entre 80 centímetros e 1,5 metro. O aumento rápido nos próximos anos está associado ao derretimento rápido das camadas de gelo.”
Etanol sustentável
"Uma solução climática no mundo não passa por abandonar um combustível por outro. Todos terão de estar envolvidos.” Com esta afirmação, Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção da ONU para Mudanças Climáticas, ressaltou para a imprensa mundial em junho que o etanol brasileiro não gera desmatamento e é sustentável, numa comparação ao biocombustível de óleo de palma e ao etanol do milho, e que muitas das críticas ao combustível vêm da indústria do petróleo.
O representante da ONU também alertou que os países emergentes e produtores de etanol devem estar abertos a debater com o setor do petróleo sobre alternativas de tecnologias limpas. "O que precisamos é que todos se sentem à mesa para discutir. A solução para a questão climática não será a de escolher entre um ou outro combustível. O debate sobre o futuro do etanol precisa ser mais sofisticado", disse. Segundo Boer, o critério de sustentabilidade será o que determinará se o etanol poderá ou não fazer parte da solução climática no mundo de redução das emissões de gás carbônico.
Oceanos “asfixiados”
No mês em que se comemorou o Dia Mundial dos Oceanos (08/06), a WWF (World Wide Foundation) divulgou dados nada animadores sobre a saúde dos mares. De acordo com relatório concluído pela ONG internacional, cerca de 200 mil km² do fundo do mar estão praticamente mortos, número quase quatro vezes maior do que o identificado em estudo similar feito há 13 anos. As principais ameaças para os oceanos são o descarte de lixo nas águas, a pesca predatória e as mudanças climáticas. Tudo isso leva a uma “asfixia das águas”, com a diminuição drástica dos níveis de oxigênio, e a graves conseqüências ecológicas e econômicas para os povos que dependem dos oceanos.
A pesca predatória também gera um outro efeito que indica sérios desequilíbrios nos ecossistemas marinhos: a dramática proliferação de medusas nos oceanos de todo o planeta. O Instituto Oceanográfico de Paris advertiu que as medusas, criaturas marinhas sem cérebro, compostas em sua maior parte por água, foram ocupando em silêncio o vazio deixado pelo voraz apetite humano por pescado. O veneno desses invertebrados, usado para defesa, é bastante forte e mata, por ano, mais pessoas do que ataques de tubarão.
Mas o mais alarmante é que o aumento populacional das medusas tem devastado as espécies marinhas nativas dos mares. Quando atuns, tubarões e tartarugas se tornam mais raros, as medusas perdem seus predadores e, por sua vez, se alimentam de pequenos peixes e de zooplâncton através dos seus tentáculos venenosos. Por isso é difícil que os peixes voltem a habitar lugares colonizados por medusas, mesmo se a atividade pesqueira comercial for reduzida.
Não ao comércio de madeira ilegal
Os Estados Unidos deu um passo à frente no processo de combate à extração de madeira ilegal no mundo. No dia 19 de junho, o Congresso norte-americano aprovou legislação histórica que proíbe a importação de madeira ilegal, incluindo não apenas madeira em tora, mas também diversos produtos florestais, indo de móveis a papéis. Isto faz com que o país seja o primeiro no mundo a proibir comércio de madeira ilegal.
A nova legislação é uma emenda de um estatuto centenário que combate o tráfico de fauna e flora silvestre. Em 180 dias, prazo para a lei entrar em vigor, passa a ser uma violação à lei federal americana a "importação, exportação, transporte, venda, recebimento, aquisição ou compra" de qualquer planta que tiver sido "retirada, possuída, transportada ou vendida" em violação às leis estrangeiras, incluindo proibição ou autorização de exploração madeireira, medidas de proteção florestal e legislação tributária.
Os efeitos da nova lei americana serão importantes para o Brasil: os Estados Unidos são o maior importador individual de madeira amazônica, sendo responsáveis pela compra de 25% do total de madeira extraída na região."Como boa parte da madeira produzida na Amazônia é ilegal, a decisão do Congresso americano pode fechar uma parte importante do mercado para a madeira brasileira", declarou Marcelo Marquesini, coordenador do programa de madeira do Greenpeace na Amazônia.
Desperdício de água
A água desperdiçada nas capitais do Brasil daria para abastecer 38 milhões de pessoas, aproximadamente a população de países como a Argentina. A constatação é do Instituto Socioambiental (ISA), após realização de pesquisa concluída no final do ano passado. Averiguou-se que em várias cidades brasileiras os mananciais apresentam problemas de poluição e de desperdício de água nas redes de distribuição. “A gente perde por dia, antes de chegar à casa dos consumidores, uma quantidade de água muito grande”, disse Marússia Whately, coordenadora do ISA, em entrevista à Rádio Nacional.
Embora o Brasil seja um dos países com maior quantidade de água – cerca de 12% de água potável –, a distribuição no território nacional não é adequada. São Paulo, por exemplo, é uma cidade que já vive o chamado “estresse hídrico” (muita gente e pouca água). Já existe uma produção de água muito próxima do que se precisa tirar dos mananciais para consumo, mas o desperdício de água “pelo caminho” ainda é muito grande. Em São Paulo esse número chega a 30%, o equivalente ao abastecimento de 4 milhões de pessoas.
Aviação limpa
Durante a Cúpula de Aviação e Meio Ambiente, realizada em abril na Suíça, representantes dos principais nomes da indústria da aviação mundial - incluindo a brasileira Embraer - comprometeram-se a acelerar as medidas que diminuam seu impacto no meio ambiente, especialmente no que se refere ao aquecimento global. As empresas reconheceram suas "responsabilidades ambientais" e se comprometeram a fazer todo o possível para minimizar os efeitos causados pela indústria da aviação.
Organizações como a IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo, na sigla em inglês) expressaram a intenção de impulsionar o desenvolvimento e a aplicação de novas tecnologias, especialmente para viabilizar combustíveis mais limpos. As empresas também afirmaram estarem dispostas a otimizar a eficiência dos combustíveis de suas frotas e em melhorar a elaboração de rotas aéreas, a gestão do tráfego aéreo e as infra-estruturas aeroportuárias. Segundo dados da ONU, a aviação é responsável por 2% das emissões globais de gás carbônico e está previsto que passe a ser responsável por 3% até 2050.
Fontes: BBC Brasil, IUCN, Ambiente Brasil, Agência Envolverde, WWF e Rádio Nacional
*Publicado na edição n. 79 (maio/junho 2008) do Informativo do Instituto Ecológico Aqualung (acesse aqui).
terça-feira, julho 29, 2008
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